Mal de altitude, doença da montanha, soroche ou hipobaropatia é uma enfermidade que acomete grande parte dos viajantes que se aventuram por terras altas como Machu Picchu (2.430), Cusco (3.399), La Paz (3.640), Lhasa (3.656) e Puno/ Lago Titicaca (3.827).
Se você, assim como eu, mora em um lugar baixo, como São Paulo, Rio de Janeiro, Campo Grande ou Recife, dificilmente vai passar 100% imune à altitude. Isso porque seu corpo está acostumado com um ambiente onde o oxigênio é abundante. Em locais altos há menos moléculas de oxigênio no ar, o que o torna rarefeito. Consequentemente, nosso sangue fica com menos oxigênio e nosso corpo trabalha para se adaptar às novas condições climáticas.
Vale lembrar que, segundo pesquisadores, os efeitos da altitude são mais perceptíveis acima dos 2.300 metros. Ainda de acordo com especialista, até 2.000 metros o corpo humano entende que estamos no nível do mar.
Sintomas
Diferentemente do que muitas pessoas pensam, os sintomas do mal de altitude não aparecem necessariamente assim que você desce do avião. Eles podem se manifestar poucas horas depois de sua chegada ou somente no dia seguinte. Cada organismo é único, portanto, cada um sente a altitude de um jeito.
São eles: dor de cabeça, náusea ou vômito, incapacidade de realizar esforço físico, fadiga, respiração acelerada, falta de ar, síndrome de angústia respiratória do adulto (SDRA), dificuldade em dormir, sonolência, perda de apetite e baixo nível de oxigênio no corpo.

Meu primeiro contato com a altitude foi no Peru em 2014. Sai de Lima (nível do mar) e fui para Cusco (3.399). Algumas horas depois de chegar na cidade, sai para andar pelas ruas e, de repente, senti malemolência no corpo, seguida de uma forte tontura. Com descanso e hidratação, os sintomas passaram em poucos minutos e fiquei bem durante toda a viagem, inclusive em Puno (3.827).
Mas, durante minha segunda passagem pelo Peru, em 2017, a altitude foi minha grande inimiga. Passei sete dias em Puno e praticamente em todos precisei de oxigênio. Na ocasião, logo quando cheguei ao aeroporto de Juliaca, o mais próximo da cidade de Puno, senti dor de cabeça. No mesmo dia, pouco tempo depois de chegar no hotel, estava deitada, caindo no sono, quando acordei com uma forte falta de ar, dores no peito e ânsia de vômito. Depois, em todos os rolês, ficava zonza e sentia meu corpo pesado em algum momento. Em resumo, os passeios acabavam comigo tendo que parar de andar por uns minutos e indo para o oxigênio o quanto antes. Provavelmente, senti a altura de forma mais severa por não ter aclimatado.
Lembrando que cada pessoa é de um jeito e não é possível prever como vamos reagir à altitude. Outro ponto interessante é que, geralmente, as pessoas conseguem se aclimatar em um curto espaço de tempo em altitudes até 3.000 metros.

Dicas para driblar o mal de altitude
É quase impossível não sofrer do mal de altitude. Mas é possível amenizar os sintomas. O primeiro passo é montar seu roteiro de forma que sua viagem comece em cidades baixas e, aos poucos, suba. Portanto, a palavra-chave é: aclimatação. Adaptar-se a altitude é fundamental e faz muita diferença.
E, por isso, ao chegar no destino de altitude, descanse e programe passeios sem pressa para os dois primeiros dias. Não exija muito do seu corpo logo de cara. Deixe as andanças, trilhas e atividades que demandam maior esforço fisico para depois. Além disso, caminhe devagar.
Trabalhar sua respiração também pode ajudar a combater os sintomas da doença da montanha. Uma vez em Puno, um guia nativo de Uros sugeriu o seguinte exercício: inspire o ar profundamente, segure por poucos segundos e expire devagar pela boca. Repita cinco vezes.
Beber bastante água também é essencial e o ideal é mais de 4 litros por dia. Uma vez que a desidratação agrava os sintomas da altitude, ingerir bebidas alcoólicas e abusar do sal não é uma boa ideia. Além disso, faça refeições leves, uma refeição mais pesada demanda um maior esforço do organismo na hora da digestão. Verduras, legumes, frutas, e cereais são ótimos para evitar o soroche. Além disso, na altitude, não dispense o chocolate.
Antes de fechar sua hospedagem, confira se o estabelecimento oferece bombas de oxigênio para o caso de você se sentir muito mal. Atente pois alguns lugares cobram o uso dos galões, enquanto outros emprestam sem custo extra. Em algumas cidades, como Cusco, é relativamente fácil encontrar pequenos galões de oxigênio em farmácias e mercados. Vale ter bombinhas de oxigênio para trekkings e caminhadas mais longas, principalmente em alturas acima dos 3.000 metros. Acho importante ressaltar que o ideal é não passar mais de 15 minutos com a máscara de oxigênio, além de usar somente quando realmente necessário. Isso porque se você não sair da bomba, seu corpo nunca vai se ajustar.
Vale a pena consultar um médico antes de viajar. Assim, você fica por dentro das medicações que podem te auxiliar caso você sinta os efeitos da altitude. Se você sofre de asma ou qualquer outra doença pulmonar, com certeza não deixe de visitar um pneumologista.
Lembre-se sempre de manter a calma, especialmente se você sentir algum sintoma da doença da montanha. Ficar afobado e se desesperar só irá piorar a situação.

O chá de coca funciona?
Primeiramente, apesar de servir de base para a droga, a folha de coca não tem nada a ver com a cocaína, não deixa ninguém chapado e não tem nenhum outro efeito do tipo, além de não ser ilegal no Peru e na Bolívia. Mascar a folha de coca ou beber o chá faz parte da cultura andina há milhares de anos – arqueólogos encontraram folhas mastigadas em ruínas peruanas que datam de 8 mil anos.
Voltando à pergunta: comigo, o chá funciona! Mas pode ser que com você, não. De qualquer forma, a coca serve para aliviar náusea, tontura, dores de cabeça e o mal-estar, além de estimular o funcionamento do organismo.
Para mim, o chá de coca é gostoso e seu sabor é bem suave – lembra um chá de hortelã muito diluído. O chá pode ser facilmente encontrado em qualquer mercado, além de normalmente ser oferecido nos hotéis, hostels e aeroportos de lugares altos. Já a folha de coca também pode ser facilmente encontrada e é barata, mas não acho seu gosto agradável – lembrando que para elas fazerem efeito é preciso mascar várias. Outra alternativa são as balas de coca, conhecidas como caramelos, elas são adocicadas, gostosas e também fazem efeito no organismo.
Outro chá bastante útil para evitar o mal de altitude é o chá de muña, que na minha opinião é bem mais saboroso que o chá de coca. A muña também é típica dos Andes e possui propriedades digestivas e que ajudam a combater náuseas.

Em No ar rarefeito, de Jon Krakauer, o autor narra seu ataque ao cume do monte Evereste. Ao longo da história, ele descreve a evolução dos sintomas do mal de altitude e as estratégias para aclimatar. Para chegar ao topo do mundo, ele passa por Kathmandu (1.400), pelo aeroporto de Lukla (2.860), o acampamento base (5.150) e, finalmente, o cume do Evereste a 8.848 metros acima do nível do mar.
É importante ressaltar que preparo físico faz bem e melhora seu condicionamento cardíaco e pulmonar. Mas ser fitness não isenta você de sofrer o mal de altitude. Soroche está relacionado com falta de oxigênio no organismo e não com o tempo que você gasta correndo na academia.
De qualquer forma, não desdenhe da altura e tenha em mente que os sintomas mostrados neste post são chamados de sintomas primários. Eventualmente, eles podem evoluir para sintomas mais graves que, por sua vez, podem resultar em morte. Se os efeitos da altitude persistirem e não amenizarem, não deixe de consultar um médico e pedir por ajuda. Além disso, desça o quanto antes.
Capa:
Como sempre, matéria interessante. Gostei!
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