As ilhas flutuantes de Uros, em Puno

O Peru guarda alguns dos lugares mais incríveis do mundo, isso é fato bem conhecido. Entretanto, a misticidade do país não está somente em Machu Picchu e nas linhas de Nazca. As ilhas flutuantes de Uros preservam tradições que nasceram antes mesmo do próprio império inca e hoje são o segundo destino mais visitado do país.

A comunidade de ilhas, conhecida como Uros, está localizada no imponente lago Titicaca, o lago navegável mais alto do mundo – com seus 3.810 metros de altitude, o Titicaca está entre a fronteira do Peru e Bolívia. Ao longo dos anos, o conjunto de ilhas artificiais se estabeleceu nas margens peruanas do Titicaca, nas proximidades da cidade de Puno. O curioso, todavia, é que as ilhotas são fabricadas a partir de uma planta muito comum pelo lago: a totora (junco).

Pesquisadores acreditam que antes de viver nas águas do Titicaca os Uros viviam na margem do lago, em terras que hoje pertencem à Bolivia. Contudo, existem diversas teorias a respeito dos motivos que levaram esse povo a migrar para o lago. Alguns acreditam que a expansão dos incas impulsionou os Uros para o Titicaca enquanto outros dizem que foi a chegada dos espanhóis que acarretou tamanha mudança. Em ambos os casos, os Uros teriam visto na imensidão do lago uma forma de proteger as tradições contra povos invasores.

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Canoas de totora adaptadas para passeios turísticos. Foto: arquivo pessoal

Independentemente dos motivos que levaram o povo Uro a migrar para o lago, o Titicaca é sagrado e amplamente respeitado como berço de deuses. Segundo a mitologia andina, foi nas águas do lago que nasceu Manco Cápac, filho do Sol, e Mama Ocllo, filha da Lua. Após emergirem das profundezas do Titicaca, os deuses caminharam até o Vale Sagrado e lá fundaram a capital do império inca, a cidade de Cusco.

Desde 1997, toda parte peruana do lago, e consequentemente os Uros, está dentro de uma área de 36.180 hectares conhecida como Reserva Nacional do Titicaca (RNT). A reserva proteje a fauna e a flora da região. Além disso, a RNT contribui para que comunidades que habitam o lago possam manter suas tradições vivas e praticar de forma saudável o chamado turismo vivencial. Saiba mais sobre a Reserva Nacional do Titicaca aqui.

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Totoras formando a superficie de uma ilha flutuante. Foto: arquivo pessoal

Como conhecer as ilhas flutuantes 

Com a chegada do turismo na região durante a década de 1960, as ilhas passaram a ser cada vez mais um atrativo bastante visado pelos viajantes. Para chegar até os Uros é necessário um barco e um guia. As opções são duas. A primeira é negociar com um guia no próprio cais de Puno. Normalmente, há diversos homens pelo cais que oferecem passeios pelo lago Titicaca, incluindo as ilhas flutuantes de Uros. Vale checar a embarcação que será utilizada para o passeio e pegar algum contato da pessoa com quem você está fechando o serviço.

A outra opção é contratar uma agência de turismo. Na minha opinião, o passeio pode ser tranquilamente fechado em Puno com alguma agência local – vale investigar os preços oferecidos nos diversos estabelecimentos da Calle Lima. Há também a possibilidade de contratar o serviço de uma agência através de sua própria hospedagem. O preço do passeio nas agências é um pouco mais salgado, mas a qualidade do serviço pode compensar.

Vale lembrar que ao fechar o passeio, seja com uma agência ou diretamente com um guia, você paga automaticamente uma autorização para entrar na comunidade dos Uros, é uma taxa pela visitação.

Além das ilhas flutuantes de Uros é possível conhecer ilhas naturais do lago, como Taquile e Amantaní. Grande parte dos passeios turísticos propõe visitar os Uros e Taquile ou Amantaní no mesmo dia, ou seja, oferecem um tour que dura o dia inteiro. Mas, você pode conversar com seu guia/agência para fechar o roteiro que mais se adequa aos seus gostos e planos, optando por um passeio de meio dia, por exemplo. Há também a opção de fazer os passeios em grupo ou de forma privada.

O passeio pelas ilhas flutuantes costuma durar entre 2 e 3 horas. A viagem de Puno para os Uros leva 15/ 20 minutos. O tour é simples e segue o mesmo roteiro, independentemente da agência escolhida ou do guia. Ao visitar os Uros, você vai conhecer alguns fatos sobre o lago Titicaca e sobre o povo do lago, além de descobrir como as ilhas são feitas e todas as utilidades da totora. Assim que desembarcar em uma ilhota você certamente será recebido com simpatia, sorrisos e saudações em aymara (idioma oficial dos ilhéus). Dificilmente você não vai ficar encantado com a paisagem e com ares de curiosidade ao experimentar a sensação de pisar em uma ilha totalmente fabricada a partir de vegetais.

Ao longo do passeio, vale aceitar o convite para conhecer uma casa de totora e vestir-se com roupas típicas. Durante sua estada na ilhota, você também pode aceitar a sugestão despretenciosa de seus anfitriões para um passeio de canoa pela comunidade por apenas 20 soles. Caso tenha um bebê Uro na ilha, muito provavelmente ele irá entrar na roda do turismo e irá ser abençoado com um padrinho e uma madrinha – claro que os ilhéus irão sugerir que os novos padrinhos deixem alguns trocados para o afilhado. Quando o tour pela ilha termina, os Uros oferecem aos visitantes suas diversas peças de artesanato, como miniaturas das casas e canoas, chaveiros e lindos painéis bordados com imagens do povo do lago.

Acho importante falar que hoje o turismo e a venda de artesanatos são as principais fontes de renda dos Uros. Portanto, as ilhotas e as tradições pré-colombianas são mantidas principalmente por uma questão de sobrevivência – muitos Uros já vivem na cidade de Puno. Além disso, as mais de 90 ilhas que compõe a comunidade seguem um sistema de rotatividade, assim nenhuma família fica sobrecarregada e todas podem se beneficiar com as atividades turísticas –  as ilhas possuem acordos com as agências de turismo para receberem os visitantes de forma controlada.

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Mulher nativa ao lado de seus artesanatos. Foto: arquivo pessoal

É fato irrefutável que o passeio para as ilhas de Uros é bastante turístico e, por isso, algumas pessoas podem torcer o nariz. Mas, falando de forma sincera, é através das ilhas e da possibilidade de mostrar esse modo de vida que essas pessoas se sustentam. E verdade seja dita, quem viveria em uma ilha úmida, fria e no meio de um lago com uma cidade que oferece uma melhor qualidade de vida a poucos quilômetros? Acredito ser injusto julgar os Uros de hoje e recusar um passeio só por não ser 100% real. De qualquer forma, não desperdice a oportunidade de conhecer um estilo de vida totalmente diferente do seu e de aprender sobre um povo que desafiou a natureza há muito tempo ao escolher viver em um lago como o Titicaca. Conhecimento nunca é demais.

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Barco de totora abarrotado por turistas. Foto: arquivo pessoal

Como o Titicaca está entre Peru e Bolívia, é possível conhecer o lago saindo dos dois países. Do Peru, os passeio saem de Puno, e da Bolívia, de Copacabana – estive em Puno duas vezes (2014 e 2017) e de acordo com o que pesquisei, fazer os passeios a partir de Copacabana é mais caro. Para passeios pelo lago Titicaca e pela região de Puno, eu indico a Titicaca Travel Peru e TitiKaKa Uros Adventure.

Titicaca Travel Peru

Calle Lima, 340 – Puno, Peru

titikakatravel@gmail.com

ventas@titicacatravelperu.com

reservas@titicacatravelperu.com

TitiKaKa Uros Adventure

Avenida Titicaca, 461 – Puno, Peru

r-coila25@hotmail.com

(51) (54) 968395572

Rober Coila

Vale a pena dormir em Puno?

Na minha opinião, sim! Incluse, é muito válido programar os dias em Puno de acordo com os passeios que você quer fazer na região, sejam eles no lago ou não.

Muitas pessoas chegam na cidade pela manhã, realizam algum passeio de meio dia no lago e vão embora, uma programação bastante cansativa e restrita. Acredito que vale chegar com calma na cidade, dormir uma noite e fazer passeios pelo Titicaca no dia seguinte, podendo ir embora no mesmo dia durante o fim de tarde/noite ou dormir em Puno mais uma noite e visitar Aramu Muru ou Sillustani antes de deixar a cidade pela manhã seguinte. Em Puno, eu indico Sonesta Posada del Inca, um hotel bastante confortável na beira do lago.

Além disso, também é possível dormir em uma ilha flutuante e experimentar a sensação de viver em meio à imensidão que é o Titicaca. Para isso, há ilhas dentro da comunidade construídas especialmente para abrigar turistas que decidem aventurar-se por uma noite no lago – são hotéis flutuantes. Uros Aruma Uro é uma das opções de hospedagem.

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Garotinha da isla Purimita Corazón. Foto: arquivo pessoal

Como chegar em Puno

Cruz del Sur opera ônibus que saem tanto de Cusco quanto de Arequipa com destino a Puno; já a Turismo Mer efetua a viagem de Cusco a Puno e vice-versa – Puno está a 340 km de Cusco. Outra opção é viajar de avião. Mas, o aeroporto mais próximo fica na cidade de Juliaca, a 43 km de Puno. Dessa forma, em Juliaca é possível pegar um taxi, alugar um carro ou contratar um serviço de transfer para que você chegue em Puno. Há voos diretos de Lima e Cusco para Juliaca.

Outra opção (mais cara) é ir para Puno de trem. A PeruRail opera o Belmond Andean Explorer, um trem dormitório de luxo que circula por quatro itinerários: ida/volta Cusco – Puno – Arequipa (Peruvian Highlands e Andean Plains & Islands of Discovery) e ida/volta Cusco – Puno (Spirit of the Water e Spirit of the Andes). No Turomaquia você pode ler um relato sobre o Andean Explorer.

Puno é uma cidade alta, portanto vale ficar atento aos efeitos da altitude. Aqui você pode ficar por dentro da doença da montanha e saber como driblá-la.

Quando ir

Puno segue a regra geral do Peru: evite durante o período de chuva – fim de novembro/ começo de dezembro até fevereiro. Outubro/início de novembro é uma boa opção, pois o clima está quente e o tempo aberto. Julho é o mês mais frio, especialmente na região dos Andes.

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Aglomerado de ilhas flutuantes com o Altiplano Peruano ao fundo. Foto: arquivo pessoal

Alguns fatos sobre o lago Titicaca

  • Está entre Peru e Bolivia
  • 3.810 metros de altitude
  • 280 metros de profundidade máxima
  • 8.560 km² de área
  • 165 km de extensão
  • A temperatura não ultrapassa os 10ºC
  • Muito antes dos incas, os povos nativos da região do lago atribuíram a ele o formato de um puma
  • Titicaca significa puma de pedra – em aymara, titi é puma e qaqa é pedra, então titiqaqa

Los Uros

Num lugar longínquo, mascarado por esplêndidas montanhas, um imenso Lago, de um tom azul muito escuro, repousava solitário. Há muito tempo, antes mesmo do nascimento dos deuses, suas águas haviam sido abençoadas pela própria Pachamama. Após muitos séculos de calmaria e paz, o Homem, num ato de desespero pela vida, recorreu ao Lago. Contrariando todas as advertências da Mãe Natureza, o grande Lago acolheu o Homem. A relação de troca e harmonia, criada entre os dois, fez com que o lago permitisse que o Homem evoluísse sobre suas águas durante muito tempo. Assim, com o consentimento das águas, o Homem do Lago fez o que parecia ser impossível e impensável. O lago é o Titicaca. O povo é Uro. O impossível é viver sobre ilhas flutuantes de junco. E o impensável é fazer isso num lago cuja temperatura não ultrapassa os 10ºC. Hoje, a mítica relação entre eles já não é tão cheia de equilíbrio. No entanto, os ilhéus, que vivem na parte peruana do Titicaca, ainda preservam ao máximo a cultura nascida no lago navegável mais alto do mundo.

Los Uros (1 ed.) é um lirvo-reportagem produzido por mim como trabalho de conclusão do curso de jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP). Ao longo da narrativa, eu exploro as diversas peculiaridades sobre o estilo de vida do povo do lago, inclusive o complexo cenário dos dias de hoje que consiste em preservar uma cultura milenar em prol da sobrevivência.

Atualmente, é possível adquirir a versão digital de Los Uros através da Amazon, disponível em ebook Kindle.

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2 comentários sobre “As ilhas flutuantes de Uros, em Puno

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