* Este texto contém spoilers
A série é uma produção da Netflix e é baseada no best-seller homônimo do escritor norte-americano Jay Asher. Apesar do elenco ser composto, em sua maioria, por novatos, há nomes como Kate Walsh (Grey’s Anatomy e As vantagens de ser invisível), Derek Luke (Capitão América – o primeiro vingador e Procura-se um amigo para o fim do mundo) e Brian D’Arcy James (Spotlight).
O jovem Clay Jensen recebe uma caixa de sapato contendo sete fitas-cassetes gravadas por sua amiga, e paixão secreta, Hannah Baker duas semanas antes dela cometer suicídio. Nas fitas, Hannah lista treze motivos que a levaram à decisão de acabar com a sua vida – há também instruções para que as fitas sejam repassadas entre alguns indivíduos. Enquanto isso, os pais da menina tentam entender o que houve com a filha e todos no colégio demonstram sensibilidade diante da morte de Hannah.
Antes de mais nada, 13 Reasons Why é uma série que deve ser assistida com muita, muita cautela, pois é cheia de gatilhos e, por isso, a forma como muitas coisas são mostradas nos episódios podem ser bastante delicadas para muita gente.
Bullying, cyber bullying, abuso, violência, depressão, estupro e suicídio são temas tratados de forma bastante realista e crua ao longo da trama. E é aí que mora o perigo de 13 Reasons Why.
A mensagem final que você vai receber quando terminar os 13 episódios depende muito da sua visão de mundo e das suas vivências. Pode ser que você assista e se sensibilize com a sua influência na vida dos outros; pode ser que você se dê conta de que machismo, estupro, bullying e suicídio são problemas reais que merecem muita atenção; pode ser que ao final da série, você perceba que existiam pessoas que amavam a Hannah e que também existem pessoas que te amam; mas, pode ser que a mensagem para você seja de que não há esperança e que suicídio seja realmente um caminho, o que não é verdade. A narrativa é cheia de riscos. Então, na dúvida, não assista.
13 Reasons Why tem um ritmo parado que é, muitas vezes, bastante irritante – Clay leva dias para ouvir as treze fitas. Tudo isso cria um efeito de angustia e ansiedade no telespectador ao longo da narrativa. O tempo dos episódios é marcado pela mudança da temperatura da imagem – os tons quentes para quando Hannah estava viva e tons frios para o presente, em que Hannah já cometeu suicídio.
A série é muito bem adaptada para os dias de hoje. A abordagem da relação dos jovens com as mídias sociais, como Facebook e Instagram, é bem realista e estabelece uma ótima conexão com o cyber bullying. Vale lembrar que a questão do bullying virtual é relativamente nova, tendo surgido com a chegada da internet.
A trilha sonora de 13 Reasons Why é consideravelmente peculiar. Há desde Selena Gomez, produtora da série, com o cover de Only You do Yazoo e seu próprio hit pop Kill’em With Kindness numa versão lenta, até The Cure e Joy Division. Vale apontar que a música Hey, Hey de Neil Young foi citada na carta de suicídio de Kurt Cobain e que o vocalista do Joy Division, Ian Curtis, tirou a própria vida em 1980. Você pode escutar a trilha completa aqui.
13 Reasons Why mostra de forma muito clara as consequências que ações podem desencadear na vida de uma pessoa. Além disso, mostra também o quão problemática é a atitude de muita gente ao não questionar bullies ou não interferir nos momentos em que alguém é colocado em uma situação constrangedora. E essa questão é interessante, pois a narrativa discute o fato de que, muitas vezes, as pessoas nem ao menos se dão conta da gravidade de suas ações– esse é o caso de Jessica, Zach e Ryan, por exemplo.
Um ponto que achei muito problemático é que apenas o episódio 9, 12 e 13 contém um aviso de cenas perturbadoras e fortes, referentes aos estupros e ao suicídio. Fato é que todos os episódios deveriam ter esse aviso. Faltou muita consideração com as pessoas que podem ter gatilhos assistindo 13 Reasons Why – as cenas em que Hannah é vítima de bullying no colégio, por exemplo, podem ser um pesadelo para muita gente.
Outra questão que me incomodou é o fato da narrativa não tentar apresentar uma alternativa para a Hannah. Parece que as pessoas que amam a garota e se importam com ela só se manifestam após sua morte, como é o caso de Clay e dos próprios pais. Além disso, sinceramente, não considero que o Sr. Porter seja uma figura que representa a ajuda, muito pelo contrário. Parece que o papel da personagem é reforçar a ideia de que não há esperança e de que não adianta pedir ajuda – quando Hannah recorre à figura do conselheiro da escola é fato que ela não consegue se expressar totalmente, feita a ressalva sobre tudo o que ela sofreu, mas o Sr. Porter parece não fazer questão nenhuma de se esforçar para entende-la; em muitos momentos, ele insinua que a culpa é dela pelo estupro e trata as falas dela de forma bastante banal.
Logo quando terminei 13 Reasons Why, achei maravilhosa. Provavelmente, se eu tivesse escrito esse texto logo após o fim dos episódios, ele seria completamente diferente. Mas o tempo foi passando e, com ele, veio a reflexão e a leitura de muitos outros textos com pontos de vista bastante diversificados. Minha conclusão, se é que é possível ter alguma conclusão concreta sobre a série, é que o real público alvo de 13 Reasons Why são os bullies e pessoas que não dão a devida importância a temas relevantes ~ depressão, machismo e suicídio. Como coloquei mais acima, a série pode gerar diferentes interpretações nas pessoas, mas para quem sofre/ sofreu como a Hannah, o viés negativo da trama pode se sobressair.
E aí entra um ouro problema. 13 Reasons Why dá voz a assuntos que precisam deixar de ser tabus o quanto antes e cuja discussão é extremamente necessária. A representação desses assuntos é bastante explicita e clara, assim como as consequências. No entanto, de que adianta ter toda uma preocupação em mostrar como humilhação, bullying, machismo, assédio e estupro são coisas horríveis se o público não está afim de pensar fora da caixa enquanto assiste?
Acredito também que a série seja válida para pais com filhos crianças/ adolescentes. De certa forma, 13 Reasons Why pode abrir os olhos dos responsáveis para alguns problemas que os filhos podem estar passando, como o cyber bullying, que é, muitas vezes, esquecido por mães e pais que não são da geração da internet.
Vale lembrar que tudo o que a Hannah passa ao longo dos episódios não é frescura – muitos telespectadores consideraram ridículo e dramático o fato de Hannah incluir Ryan nas fitas (ele divulgou um poema, bastante intimista, de Hannah no jornal do colégio sem a autorização dela), mas para alguém sensibilizado e que está sofrendo, é grande coisa. Tudo o que acontece, afeta a vida das pessoas de alguma forma e está faltando muita empatia com depressão e suicídio por parte de muitos telespectadores. Contudo, o enredo realmente falhou em não explicar a forma como a mente de alguém com depressão e prestes a cometer suicídio funciona – eventos impactantes para Hannah são retratados de modo bastante simples, ignorando toda a complexidade que provavelmente estava se passando dentro da mente dela.
Nós subestimamos, e muito, o nosso impacto na vida das outras pessoas. Infelizmente, é realmente muito triste que precisamos de séries, filmes, livros ou acontecimentos pontuais para nos darmos conta disso. E essa é uma outra mensagem, muito bonita por sinal, deixada por 13 Reasons Why. O mundo precisa de pessoas mais empáticas e muitas coisas precisam deixar de ser tabu na nossa sociedade. O suicídio é uma das maiores causas de morte entre jovens e, por isso, não pode ser ignorado.
De qualquer forma, a série não deveria ser romantizada e tratada como simplesmente um série teen. A trama é ambígua, delicada, perigosa e extremamente realista. Ao mesmo tempo que dá vários tapas na cara em algumas pessoas e sensibiliza outras, 13 Reasons Why pode ferir muita gente.
Em meados de maio de 2018 a segunda temporada do seriado foi ao ar na Netflix. Os capítulos narram as consequências da morte de Hannah Baker e, bem como ocorre na primeira temporada, podem ser um gatilho para muitas pessoas (especialmente o último).
13 Reasosn Why: tentando entender os porquês
É um making off, de trinta minutos, que foi disponibilizado na Netflix no mesmo dia da estreia da série.
O elenco, produção e alguns profissionais de saúde discutem questões abordadas ao longo dos 13 episódios, como bullying, estupro e abuso.
O curioso é que é nesse pequeno documentário que está a mensagem de esperança, de que “suicídio não é uma opção”, vendida pela Netflix. Vale assistir, pois é informativo e a temática é abordada de forma didática e responsável1.
Efeito Werther
Esse termo vem da psicanálise e quer dizer que o suicídio de uma personalidade ou a representação de um suicídio pode levar pessoas a fazerem o mesmo. Exemplos clássicos desse efeito, segundo pesquisas, são as mortes de figuras como Kurt Cobain e Marilyn Monroe.
O Efeito Werther tem esse nome por conta do livro O sofrimento do jovem Werther, do escritor alemão Goethe. Na obra, o protagonista tira a própria vida, marcando um dos momentos mais clássicos da literatura mundial. Após a publicação do livro, em 1774, uma série de suicídios se desencadeou não só na Alemanha, mas também em toda Europa.
O fato é que o efeito é realmente sugestivo. Uma pessoa com problemas e sentimentos fragilizados pode sofrer uma influência bastante negativa ao assistir 13 Reasons Why e se deparar com assuntos delicados sendo abordados de forma crua. Aliás, como será que a própria Hannah Baker iria se sentir ao ver uma série nessa vibe após ter passado por todos aqueles abusos?
Organização Mundial da Saúde
No ano 2000, a OMS lançou uma cartilha voltada para a produção de conteúdo midiático relacionado à suicídio. As três principais recomendações são: evitar romantizar o suicídio; evitar retratar o suicídio como uma resposta aceitável às dificuldades; evitar incluir o método, local ou detalhes da pessoa que faleceu. Isso tudo afim de que as produções com essa temática sejam mais voltadas para prevenção e conscientização. Além de representar uma maneira de respeitar as famílias que perderam pessoas dessa forma.
Essas três recomendações são claramente ignoradas em 13 Reasons Why, principalmente as duas últimas.
Ao longo da trama, não há uma mensagem de esperança, uma alternativa para a Hannah. O que ocorre é exatamente o oposto, a própria personagem diz que “ninguém se importou o suficiente”, deixando uma ideia de que pedir ajuda não adianta em nada.
O último episódio da série é, praticamente, um tutorial bastante frio de como colocar um fim na própria vida – o aviso de “cenas fortes” no início do capítulo pouco adianta, até porque isso costuma chamar mais atenção.
Ficha técnica
Título: Os 13 porquês (13 Reasons Why)
Ano: 2017
Lançamento: 31 de Março de 2017
Distribuição: Netflix
Gênero: drama, mistério
País: Estados Unidos
Roteiro: Brian Yorkey, Elizabeth Benjamin, Diana Son, Thomas Higgins, Nathan Jackson, Nathan Louis Jackson, Nic Sheff, Hayley Tyler.
Produção: Tom McCarthy, Selena Gomez e Joy Gorman
Direção: Carl Franklin, Gregg Araki, Helen Shaver, Jessica Yu, Kyle Patrick Alvarez e Tom McCarthy
Elenco: Dylan Minnette, Katherine Langford, Christian Navarro, Justin Prentice, Tommy Dorfman, Steven Silver, Miles Heizer, Devin Druid, Ajiona Alexus, Michele Selene Ang, Sosie Bacon, Alisha Boe, Ross Butler, Brandon Flynn, Kyle Naylor, Timothy Granaderos, Brandon Larracuente, Josh Hamilton, Amy Hargreaves, Joseph C. Phillips, Derek Luke, Brian d’Arcy James, Steven Weber, Kate Walsh.
Classificação: 16 anos
Duração dos episódios: 49-61 minutos
Amei a série. To sem rumo até agora desde que terminei de ver rs
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